Turistas de outros países não teriam vida fácil se quisessem
passear por Belo Horizonte. Foi o que constataram, na tarde de ontem, os
repórteres do Estado de Minas, que andaram na Savassi e no Centro. Antes de se
identificarem, eles se passaram por estrangeiros e conversaram em inglês com
taxistas, policiais militares, guardas municipais, atendentes de museu, de café
e de uma loja de artesanato.
NA SAVASSI
“Good afternoon! Do you
speak english?” (“Boa tarde! Você fala inglês?”), eu disse a um
taxista estacionado perto da Praça da Savassi. Assustado, ele me olhou como se
eu fosse um ET. Repeti a pergunta e ele começou a sorrir. Fez que não com a
cabeça, balbuciou algo e apontou para o táxi de trás. No outro carro, a mesma
abordagem e o mesmo espanto. Prossegui: “Do you know how can I get go the Central Market?” (“Você sabe como eu chego ao Mercado Central?”). Após mais
alguns segundos de silêncio, o taxista arriscou: “Você sabe o nome da rua?”.
Desistiu, pegou o rádio e pediu por um taxista bilíngue, mas não havia nenhum à
disposição. E o estrangeiro de mentira continuou à deriva.
Ironicamente, o segundo taxista tem nome estrangeiro.
Roosevelt Pereira, de 21 anos, admitiu que, em inglês, sabe pouco mais do que
se apresentar: “My name is Roosevelt”. “Falo muito pouco. Só o básico. Fiz aula
no colégio, mas esqueci tudo”, explicou. Sempre que alguém chega engrolando a
língua, ele apela ao rádio, mas quase nunca há colegas para socorrê-lo. “É
muito difícil achar taxista bilíngue. E os que existem, é um inglês esquisito”,
constata. Ele diz que está à procura de uma escola de inglês, principalmente
por causa da proximidade da Copa de 2014. “Estou preocupado, o pessoal vai
ficar meio perdido”, reconhece.
Em um café a poucos metros dali a garçonete
Fátima Pereira disse “no” quando perguntei se ela falava inglês. Pegou o
cardápio e começou a apontar com o dedo as opções de bebida. Expliquei: “I want
something to eat” (“Quero alguma coisa para comer”). Ela arrastou o dedo sobre
a página, muda. Depois de me identificar como repórter, Fátima disse que quando
o cliente fala língua estranha, o jeito é se virar com gestos. O gerente
do café, Devanir Rodrigues, diz que nenhum dos atendentes é bilíngue. “Eles vão
fazer um curso de inglês em breve”, informou.
Uma dupla de guardas municipais passava ali perto. “Do you speak english?”, perguntei. “Aí complicou”, disse um, sorrindo. Não desanimei: “How can I
go to the Central Market?”. Eles me olhavam e se encaravam sem saber o que
fazer. Tentei ajudar: “That’s the place where you buy food, cheese, pets” (“É o
lugar onde se compra comida, queijo, animais”). “Deve ser o shopping”, deduziu
um, que disse em voz alta: “Pá-tio Sa-vas-si”. Encarei-o, confuso. Ele me deu
as coordenadas e acabei no shopping. Lá, por sorte, encontrei um casal de
namorados que falava inglês. “Take a bus down there” (“Pegue um ônibus ali
embaixo”), orientou a musicista Gabriela Mello. E disse o número do ônibus. O
estrangeiro, enfim, chegaria a seu destino — se alguém soubesse dizer em que
ponto desceria. (TH)
NO CENTRO
“I wanna go to this place” (“Quero ir para este lugar”),
apontei o papel em que havia escrito “Praça da Estação”. Desconfiado, o taxista
Wallison Francisco Cruz, de 30 anos, me levou até lá, no Centro de BH. Na
chegada, garantiu: “Não consigo falar inglês, mas não dei nenhuma volta até a
praça”. Durante o percurso, Wallison esbanjou boa vontade, disse que tinha
começado a estudar inglês, mas não conseguiu pronunciar uma só palavra na
língua estrangeira.
Na entrada do Museu de Artes e Ofícios, abordei
uma recepcionista simpática, que me disse saber falar inglês mais ou menos.
“So, so”, afirmou, gesticulando com a mão direita. Entregou-me um guia em
inglês das instalações e me descreveu, com mímica, que bolsas e mochilas
deveriam ser deixadas em um guarda-volumes. Ato contínuo, falou pausadamente em
alto e claro português, várias vezes, na esperança de que o estrangeiro
compreendesse a regra. O segurança que vigiava o detetor de metal da entrada
tampouco falava inglês. e, apontando para o bolso da minha calça, advertiu que
telefones celulares não eram bem-vindos.
Do lado de fora do prédio de arquitetura
rebuscada, dois policiais militares que conversavam ao lado de uma van da
corporação se esforçaram para me explicar o caminho até o Palácio das Artes.
“Esqueci como fala ‘segue direto’”, disse um deles. “Acho que é ‘turn right’
(vire à direita)”, emendou. Constrangido, o outro tentou ajudar: “Fala que é
para seguir as grades do Parque Municipal e virar à direita”. O primeiro
lançou: “Across the central park. Then turn right” (“Através do parque central.
Então, vire à direita”).
No Palácio das Artes, os atendentes da loja de
artesanato não eram bilíngues e confessaram que costumam se virar com gestos
quando se deparam com estrangeiros. No balcão de venda de ingressos do Palácio
das Artes, perguntei: “Do you speak english? (“Você fala inglês?”)”. A resposta
foi sucinta: “Não”. A funcionária olhou para o lado em busca de ajuda, mas o
semblante de outra moça era pouco alentador. Pedi um guia do Palácio das Artes
em inglês, mas me disseram que não havia e que as “duas funcionárias que falam
inglês fluentemente” tinham viajado. Na volta para a redação, outro taxista
afirmou: “Até 2014, dá tempo de os gringos aprenderem português”. (FC)
Fonte: www.em.com.br (Jornal Estado de Minas)
Jornalistas: Tiago de Holanda e Felipe Canêdo
Publicação: 25/10/2012 06:00 Atualização: 25/10/2012 07:10